domingo, 1 de maio de 2011

Crônica: O Rapaz do Sinal.

Aconteceu comigo.

Fiquei aquém no pré-julgamento.

Ajuda nem sempre é sinônimo de dinheiro, ao tempo que dinheiro não é a única via para o reconhecimento.

Se o encontrarem, repassem as minhas saudações, talvez ele lembre.

http://www.paralerepensar.com.br/paralerepensar/texto.php?id_publicacao=18354

Hoje tem sido um dia sui generis. Recentemente recebi o contato de um ex-colega de trabalho que estava interessado em me encontrar e conversar sobre assuntos profissionais de interesse comum e este foi o primeiro acerto do dia, já que valeu muito a pena ouvir e discutir sobre a proposta.

Casualmente, após estacionar o carro, o meu celular tocou e tratava-se de uma ex-colega de trabalho, que virou uma grande amiga e que há algum tempo, os nossos contatos estavam silenciados e experimentei novamente o prazer de escutá-la e rir.

No lugar marcado para o encontro, tive a oportunidade de reencontrar outro antigo colega de trabalho o que foi bem reconfortante e na saída, coincidi no elevador do prédio, com um velho e legal ex-colega. Foram instantes. Foram gigantes.

Conheci também novas pessoas vinculadas com o motivo inicial.

Próximo da hora de almoço, concluímos a conversa e sai de pressa a procurar os meus filhos na escola, onde um colega deles estaria também me aguardando, porque iria para a nossa casa e lá me esperava a enorme tarefa de preparar o almoço para o qual minha esposa já tinha dado todas as instruções. Estava apreensivo. Sou uma negação na cozinha.

Mas, para completar esta parte do dia com boas lembranças e agradáveis fatos, aconteceu um que parecia, inicialmente, ser desagradável ou ao menos tristemente rotineiro.

Parei o carro num tumultuado sinal da cidade, altamente freqüentado por ambulantes, entregadores de panfletos, procuradores de esmola e até de ocasionais assaltantes.

Estava com o vidro aberto e o mantive assim. O meu bom senso, - graças a Deus desta vez acertei -, permitiu-me prever que não me aproximava de nenhum perigo iminente. Já ouvi muitos desgarradores relatos de pessoas que se sentiram discriminadas e diminuídas ao perceberem o som das travas e da subida dos vidros acionados pelos motoristas, quando se aproximavam deles e tentei fazer a minha parte para não aumentar a dor do próximo. Decidi tentar a sorte e cheio de fé aceitei o avanço daquele pessoal, que lutava sob o sol escaldante do meio-dia.

Peguei alguma que outra propaganda e ato seguido aproximou-se do carro um rapaz numa cadeira de rodas, visivelmente deficiente físico. Cortez, educada e simpaticamente pediu dinheiro, mas o reservatório onde costumo depositar moedas para eventualidades estava vazio, alguém em casa adiantou-se e expliquei-lhe que estava sem dinheiro nesse momento. Ele aceitou a minha justificativa, agradeceu e retirou-se, mas em seguida voltou e pediu-me licença para me fazer uma pergunta e eu dei-lhe toda a faculdade do mundo para perguntar o que quiser. Pensei que talvez faria alguma pergunta sobre a minha origem por causa do meu sotaque, ou alguma coisa do gênero.

Eu costumo dirigir com uma luva de couro, daquelas usadas para malhar, na mão esquerda. Esta é quase uma marca registrada minha. Alguns a catalogam de frescura, de ato de playboy, mas, com todo o respeito: não estou nem ai para esses comentários. Aperto muito o volante e aparecem calos que incomodam para certas atividades. Se por acaso a tua cabeça podre começou a imaginar detalhes maldosos, devo te dizer que você está certo, também o uso para essas coisas e machuca. 

E não é que o rapaz ficou sério, com evidentes sinais de vergonha e pediu-me a luva, caso não acarreta-se problemas para eu cedê-la?

Inicialmente não entendi o inusitado do pedido, não o associei com nada, mas confesso que não pensei duas vezes, tirei-a da minha mão e a entreguei. O momento requeria velocidade de resposta. O sinal abriria em frações de segundos.

O que aconteceu depois, acredito que não existam palavras para descrever a alegria que ele experimentou ao colocá-la na sua mão esquerda, não sem antes me mostrar o quão calejadas estavam suas mãos de acionar as rodas da sua velha e precária cadeira, dizendo que agora as coisas melhorarão para ele.

O brilho nos olhos daquele rapaz comoveu-me profundamente. Faz muito tempo que não via nada parecido. Os meus olhos também umedeceram e brilharam.

Na hora só tinha a luva da mão esquerda. Passarei por aquela mesma esquina para entregar a da mão direita.

Se passarem pelas esquinas em Belo Horizonte, onde confluem as ruas Augusto de Lima, Contorno, Ituituba, do lado de uma grande drogaria na rua João Lúcio Brandão e encontram um jovem numa cadeira de rodas com luva ou com luvas, conhecerão ao rapaz do sinal.

Que Deus te mande muitas outras ajudas!

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