terça-feira, 27 de outubro de 2015

Uma saída do desespero chamada Groupon.

Usarei o Groupon, não mais que como símbolo de sites de compras coletivas. Indiscutivelmente, um dos mais populares e bem sucedidos por estas bandas.



Toda vez que recebo uma oferta via e-mail, de alguma promoção, fundamentalmente as relacionadas com convites para restaurantes e similares, não posso deixar de lembrar os meus tempos de dono de restaurante e de como tive que me render aos “encantos milagrosos” para poder subsistir ou para me afundar ainda mais, iniciando o derradeiro e penoso caminho para o fim.

Os representantes não precisam de muito para te convencer a participar. Com a adesão terá garantido um número de clientes superior a quantidade acostumada, fundamentalmente para os dias de mais baixa afluência; mas a quê preço?

É uma relação longe de ser ganha-ganha.

O “ganha” só é garantido para os detentores dos direitos da promoção. Às vezes, os donos dos bares e restaurantes também ganham, dependendo de vários fatores, dentre eles, contarem com uma equipe de atendentes comprometida, entusiasmada, que saiba extrair o máximo do cliente sem abusar, sem ser inconveniente, de apresentar pratos com qualidade, do cardápio da casa. Condições que podem parecer muito próximas de ideais, mas alguma coisa bem próxima, às vezes é possível conseguir.

Para os leigos no assunto devo dizer que os preços originais dos pratos, conferidos no Menu do estabelecimento,  deverão ser reduzidos pela metade, para atender os requerimentos do contratante. Da parte que restou, o 50% encherá o bolso do site de compras coletivas. Ou seja, o dono da casa poderá contar com ¼ ou o 25% do preço anunciado para a iguaria. Há diferentes modalidades de negociação, mas o que sim é certo, é que o restaurante fica somente com a metade do que você pagou.

Muitas vezes a avalanche de clientes, a coincidência no mesmo dia e momento de muitos compradores da promoção provocam desconfortos e acarretam outros problemas de incapacidade de atendimento, onde o efeito esperado se triplica ao contrário, ou seja, afugenta os futuros frequentadores e a aqueles que conheceriam a casa pela primeira vez. A partir dai, você como dono, com frequência terá que escutar a dolorosa frase: ”nunca mais boto os pés neste lugar”.

Por outro lado, os frequentadores fiéis, acostumados com outro tipo de ambiente, se espantam, pois não desejam se misturar muitas vezes, com pessoas de má educação, que não sabem se comportar, que não têm costume de visitar restaurantes, que sentem prazer em fazer virar tudo num boteco-buteco ou até num "copo-sujo" e que em condições normais, nunca teriam aparecido naquele lugar.

Exigir marcar data e hora de comparecer, nem sempre funciona e muitas pessoas nem compram por encontrarem nisso uma dificuldade a mais. As pessoas querem fugir do planejamento e das obrigações.

Há comerciários que recorrem a estratégias tais como oferecer “promoções capengas”, ou seja, pratos que quase obriguem aos clientes a pedir guarnições e outros acompanhamentos. Isso pode até funcionar se o que estiver sendo ofertado não chegar a ser completamente esdrúxulo, senão pode causar a ira e a reclamação instantânea do cliente.

O restaurante deve criar um clima agradável para que o cliente permaneça e consuma. Nisso pode influenciar desde a decoração, limpeza, passando pelo conforto, as condições de compartilhar com as pessoas que te acompanham. 

Até os cheiros e sons do ambiente podem exercer influência negativa ou positiva. Devo salientar um detalhe curioso: não existe uma regra, não é questão nem tão sequer de bom senso, porque o que é bom para uns, não necessariamente terá que ser bom para todos. Pelo mesmo motivo que uns elogiam, outros criticam sem medida.

Há pessoas que só comparecem aos lugares quando arrumam uma destas promoções. Aquela ideia de fazer com que eles voltem e realizem um consumo normal, não surte também o efeito almejado. Eu experimentei isso com alguns clientes.

Outros acham que têm direito a tudo. Perante o menor incômodo ameaçam chantageando com que vão publicar nas redes sociais e publicam o que é e o que a maldade da imaginação lhes permite alcançar. Oportunistas de toda laia. 

Mas quando se sentem bem, à vontade e todos os seus desejos foram atendidos, dificilmente usariam um minuto das suas vidas para agradecer e enaltecer o lugar naquelas mesmas redes sociais, o que representa em ocasiões, a fronteira entre continuar funcionando ou fechar o restaurante, alegando que "o restaurante não fez mais que o que tinha que fazer; esse era o seu dever, cumpriu a sua obrigação, ou seja, me servirem como a um rey ou rainha, porque estou pagando, porque eu mereço".

Às vezes, você como dono é orientado a cobrar de maneira opcional dos clientes, a taxa de serviço pelo valor do prato íntegro, o famoso 10%, o que pode fazer com que se tenha um pouco mais de retorno pelo “investimento”, mas ao mesmo tempo, geralmente não é bem visto, nem bem recebido pelos usuários, que na maioria das vezes pagam, mas o consideram esquisito, sendo este mais um motivo para não voltarem.

A situação de desespero e desesperança é tal, que famosas e tradicionais casas entraram nesta ciranda, caíram nesta armadilha. O teu restaurante estará prestes a se tornar um dependente irreversível, mas se não o fizer, vai ver o teu vizinho com a casa cheia, com aparente sinal de prosperidade e a tua vazia.




Dias atrás comprei uma dessas promoções para visitar e conhecer uma hamburgueria no meu bairro, onde sempre reparava que o lugar tinha boa “cara”, mas ao mesmo tempo, me resultava uma opção um pouco “cara” comparando com os preços praticados por outras similares.

Chegou o dia. Qual não seria minha surpresa ao ver o diminuto do que eu tinha pagado, em comparação com a quantidade e qualidade do que foi servido e do atendimento. Um lugar ameno, agradável, com a comida bem apresentada, o tratamento dos garçons e donos foi impecável.

Não consumi nada mais, porque estava para lá de satisfeito.

Ao sair, não me cobraram um centavo a mais, agradeci e desejei muita boa sorte. Não pôde evitar sentir muita vergonha porque estava ciente de que o que tinha comido valia muito mais, atendendo às práticas do mercado. Senti muita dor daquelas pessoas, cheias de esperanças no meu e no retorno de todos os presentes.

Coloquei-me no lugar deles. Eu estava nessa mesma situação há poucos anos atrás.

Felizmente, voltei para a área técnica, para a engenharia, para o que me deu o pouco ou o muito que tenho e aquilo são só lembranças e experiências.

Em tempos de crise, para as pessoas não deixarem de desfrutar e não diminuírem o padrão de vida, esta é uma alternativa, mas os donos, se não acontecer uma improvável guinada, empreenderão o caminho do: “Aluga-se”, “Passa-se este ponto”, "Vende-se" e toda variedade daqueles tristes anúncios, que já atinge até os mais tradicionais lugares.

Tenho o compromisso moral de voltar ao lugar, assim que as minhas finanças o permitam.

Dor!

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