terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Para Thiago de Mello. Por Thiago de Mello.

Recentemente, postei uma reflexão sobre o papel do homem na terra.

Quando estava escrevendo, senti que sonhava acordado, me transportava para uma realidade paralela que sempre vivi. 

Muitas vezes tentei explicar sobre esse mundo e de tanto duvidarem da minha sanidade mental, desisti de me explicar, porque reconhecia que confundia ainda mais às pessoas.

Aqueles pensamentos todos me remontavam à vários anos, durante minha anterior juventude, quando num teatro sui generis da Havana: “Buendia”, conheci parte da obra do poeta brasileiro Thiago de Mello.

O grupo de teatro, numa ocasião, tomando como base os versos do artista, fez uma curiosa apresentação, onde o peso não descansava na cenografia, nem na vestimenta dos atores, não era a ambientação, nem nenhum outro recurso visual incorporado, senão as belas palavras do texto do autor, que a continuação reproduzo:

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)
A Carlos Heitor Cony 

Artigo 1
Fica decretado que agora vale a verdade, agora vale a vida e de mãos dadas marcharemos todos pela vida verdadeira;

Artigo 2
Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive as terças-feiras mais cinzentas, tem direito a converter-se em manhãs de domingo;

Artigo 3
Fica decretado que a partir deste instante, haverá girassóis em todas as janelas, que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra e que as janelas devem permanecer o dia inteiro abertas para o verde onde cresce a esperança;

Artigo 4
Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem, que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu; parágrafo único, o homem confiará no homem como um menino confia em outro menino;

Artigo 5
Fica decretado que os homens estão livres do julgo da mentira, nunca mais será preciso usar a couraça do silêncio nem armadura de palavras, o homem se sentará a mesa com seu olhar limpo porque a verdade passará a ser servida antes da sobremesa;

Artigo 6
Fica estabelecida durante dez séculos a pratica sonhada por Isaías que o lobo e o cordeiro pastarão juntos e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora;

Artigo 7
Decreta e revogada, fica estabelecido o reinado permanente da justiça e da claridade, e a alegria será uma bandeira generosa para sempre desfraudada da alma do povo;

Artigo 8
Fica decretado que a maior dor sempre foi e será sempre não poder dar-se amor a quem se ama e saber que é a água que dá a planta o milagre da flor;

Artigo 9
Fica permitido que o pão de cada dia que é do homem o sinal de seu suor, mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura;

Artigo 10
Fica permitido a qualquer pessoa, qualquer hora da vida o urro do trai branco;

Artigo 11
Fica decretado por definição que o homem é o animal que ama, e que por isso é belo, muito mais belo que a estrela da manhã;

Artigo 12
Decreta-se que nada será obrigado nem proibido, tudo será permitido, inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com imensa begonia na lapéla; parágrafo único, só uma coisa fica proibida, amar sem amor;

Artigo 13
Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar um sol das manhãs de todas, expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformará em uma espada fraternal para defender o direito de tentar e a festa do dia que chegou;

Artigo Final
Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será subrimida dos dicionários e do pantano enganoso da dor, a partir deste instante, a liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem.

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