quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Artigo: Molecagem com o Gringo.

Uma homenagem a todos os que já fomos estrangeiros alguma vez.

http://www.paralerepensar.com.br/paralerepensar/texto.php?id_publicacao=14196

Eu não sei se todos os povos fazem o mesmo, da mesma maneira e com as mesmas intenções, mas é freqüente chegar, cair de pára-quedas em outra cidade, outro país e aparecer um sujeito que tenta brincar com o teu desconhecimento, a tua sutil ignorância, por problemas da língua ou simplesmente por estar situado fora do teu contexto habitual.

Confesso que nunca fui muito vítima destes "achegados", de longe eu os cheiro.

Contarei uma estória que me aconteceu aqui no Brasil e que para mim se tornou um fato engraçado, por ter sido provocado por uma boa pessoa, que eu sei que queria e quer o meu bem e com cujas confusões, ambos nos divertíamos.

O meu amigo, com singular visual de Dom Quixote, deu-se a tarefa de me criar incertezas com relação à língua há muitos anos, quando o domínio que tinha do idioma era pior do que tenho hoje. Para alguns depois de muitos anos, ainda estou aprendendo a “língua brasileira”.

Além de equívocos engenhosos, tinha a faculdade de inventar termos, palavras, denominações, algumas delas bem sui generis.

Quando as pessoas aprendem uma língua com fins comerciais ou de se comunicar de maneira decorosa e básica com os interlocutores do país, palavras de propósito específico fogem, tais como os nomes de algumas partes do corpo.

Este caso não foi como aqueles grosseiros, grotescos e faltos de originalidade, que brincam e colocam em maus lençóis aos estrangeiros, ensinando-os de maneira errada e associando termos dados à genitália e palavrões, como vocábulos usados em conversas formais. 

Uma das confusões que ele me criou é tão marcante, que até hoje, depois de mais de 15 anos neste país e assimilando sua cultura e suas gírias, eu tenho que pensar quando falam de joelho e do cotovelo, onde é que eles ficam no corpo humano, porque foram termos que “aprendi” com ele propositalmente de maneira contrária. Imaginem! No lugar do cotovelo, ele me explicava que aquilo era o joelho e vice-versa.

Eu nunca fui muito dado à moda de usar jeans. Tenho, mas o uso em ocasiões muito particulares, já que acho que posso vestir uma calça tão esportiva quanto, sem me sentir uniformizado. Este preâmbulo é para que compreendam o que vem a seguir.

Eu costumava e costumo trocar de roupas todos os dias e sempre que chegava com uma calça diferente ele se referia a ela com um nome, muitas vezes inventado, tais como Calça Cha Cha, etc., e eu não entendia se estava fazendo referência ao modelo ou ao tecido. Até hoje não faço a menor idéia do que ele queria dizer com isto.

A minha língua materna é o espanhol e é muito comum, que palavras pertencentes ao castelhano, sejam bem similares na escrita e significado com o português, só que algumas delas perdem a letra “c” intercalada, como por exemplo: contacto que é aceito escrever e dizer contato. O mesmo acontece com tacto, etc.

Certa vez eu fiz este comentário na presença dele e aparentemente não teve maior transcendência, até que passados uns dias me assaltou uma dúvida com relação à palavra “pacto”. Já podem imaginar o que aconteceu. A partir deste momento, as palavras pacto e pato, ficaram etimologicamente iguais. Tamanha confusão! Ele fez questão de oferecer uma dissertação sobre a sobreposição destes dois termos, ou seja, para mim seriam a mesma coisa e a pagar pato daqui para frente.

Naqueles tempos aconteceu um fato insólito. Eu tinha feito uma requisição de prorrogação de visto de permanência no país, para a Polícia Federal e dias depois chegara ao apartamento onde morava, uma carta resposta, onde rezava que o meu pedido tinha sido deferido. Ô palavra problemática, nem a Mulher Melão sabe o que significa, mas lá, na empresa onde trabalhava, nem a Mulher Taboa de Passar, que era bem letrada, sabia o que significava a ciência certa. Naquela época não era como é hoje, onde a internet, quase que onipresente, resolve qualquer “anticie”.

O meu amigo também não sabia e ficou muito triste porque pensou que eu teria que abandonar o país às pressas, até que afortunadamente dei com uma pessoa, bem informada, que me acalmou e disse: “preocupa não, que a noite é uma criança”. Ô meu Deus, mais uma confusão! Eu não entendia o que isto significava, até que me esclareceu dizendo que tudo estava tranqüilo, nos conformes. Esta palavra em espanhol, também tende a criar disparidades de compreensão.

Com tudo isto, se de alguma pessoa eu guardo muito boas lembranças, é do meu amigo R, que ficou bem próximo e naqueles primeiros dias, foi uma companhia e tanto.

Onde estará o meu alto amigo R. Faz tempo que não te vejo. Ai que saudades de ocê!

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